sábado, março 31, 2007

do silêncio (pensando alto!)

Já pensei muito sobre o silêncio, por me considerar uma pessoa silenciosa, ou que dá valor a isso. E, num exercício de sensações, de sentir o outro, tenho a impressão de que as pessoas pedem silêncio, querem aprender como se sentir confortáveis quando não há palavras. E, experiência própria, ninguém agüentou meu silêncio por muito tempo. Há sempre uma cobrança por palavras, por pensamentos esclarecidos, o silêncio pode parecer, para outras pessoas, como maneira de esconder algo. Para haver silêncio é preciso haver confiança, e confiança muitas vezes está ligada às palavras. É nas palavras que as coisas mudam de sentido, onde há os desvios. Num bom silêncio há compreensão e intimidade, há serenidade e calma, há o tempo em sua duração, longe dos ponteiros. E é claro que as pessoas pedem, pedem aquilo que ainda não podem receber, querem o novo, muitas vezes sem pensar que isto é algo cotidiano, sem pensar que quebram a todo momento o silêncio que querem com pedidos desesperados.

Talvez eu esteja enganado, e na verdade sou eu quem não confia nas palavras, e talvez por isso eu necessite escrever, para me entender com elas. Mas a palavra escrita nem sempre produz sons e o silêncio físico é apenas modo de ouvir outras vozes, mais subterrâneas, lençóis d´água camadas a baixo, sangue correndo em veias escondidas.

quarta-feira, março 28, 2007

Do sono

Desde algum tempo
(os dias para mim são movediços,
difícil defini-los),
já não posso dormir tranquilamente.

À noite, sons de passos enchem
meu quarto de presença impessoal
e pela janela entram sirenes
que conduzem meus sonhos às pedras.

De manhã o sol incendeia a cama
e enchem meus olhos de vermelho.
Os pássaros fazem alvoroço
e brincam de ser galos.

Provável que os motivos
não sejam apenas exteriores.

Provável que a noite seja
apenas um estado de espírito
e que a manhã nada mais
que um golpe de estado.

E que as sirenes que me chamam
de certa forma voam em mim
e os pássaros são flechas
contra um silêncio forçado.

terça-feira, março 27, 2007

bobeiras da insônia


a insônia produz muitas coisas, a maioria, no meu caso, é bem boba.

a cidade e eu

São Paulo, hoje, é tudo que não mostrei a ela, tudo que não reteve seus passos e que, então, continua morto. E o que reteve é tão cheio de vida, que ficou leve e descolou da cidade. São Paulo, agora, está morta como uma fotografia sem contraste. Nesta cidade morta (limbo), sou um fantasma com necessidade de inferno.

domingo, março 25, 2007

improvisações

Era um dia de chuva como outro qualquer. A janela se enchera de pequenas gotas que ignoravam a gravidade da situação e não iam embora. Eu não ia embora. Não via mais graça em pegar chuva e chegar encharcado em algum lugar, seja ele qual fosse. Esperei, esperei. As gotas continuavam paradas, eu também. A chuva parecia longe de terminar, só aumentava, até que os prédios mais próximos não eram mais visíveis. Abri a janela e a água começou a entrar, invadindo todos os quartos, a sala, a cozinha, o banheiro. Os móveis começaram a boiar, o sofá passou do meu lado como se ele fosse leve, a geladeira também, ignorando toda força que fiz para subi-lo três andares por escada. Tudo ficou leve, diante do peso da água. Estranhamente não senti dificuldades de respirar. Houve continuidade, meus pulmões se encheram de água também. Sai pela janela, para ver o que acontecia nos prédios em frente ao meu.

quinta-feira, março 22, 2007

Minha cama, minha ilha

Chegaria com mãos silentes,

dedo em riste cortando a boca em duas,

cortando a voz,

a raiz da voz.


Voraz seria a palavra em desespero,

a espera inútil de mudanças de luz

quando o sol já se curvou,

quando meus joelhos

já dobrados encostam-se ao peito.


Deitado, dedo ainda em riste,

agora cortando o ar

em fragmentos de memória,

em retratos e ruínas,

Rituais de fim.

sexta-feira, março 16, 2007

ih, faz tempo

Haiku antigo, antigo, de 2002 (parece absurdamente longe, para mim). Eu era mais bobinho naquela época... era bom ser mais bobinho.


dia cinza como rotina
linda são as cores
de tudo que desatina

adios nonino astor piazzolla by Lawrence

vou conseguir tocar, ainda hoje!

terça-feira, março 13, 2007

El Tlatoani de Texcoco - Hugo Gutierrez Vega

Ya es tarde, amor desfalleciente,
ya es tarde para decir esa palabra
en la que consisten la vida
y todos sus momentos detenidos
en el umbral de la memoria.
Siempre buscamos la claridad
y a veces caemos bajo el peso
de una excesiva iluminación.

Ahora es el tiempo de los claroscuros,
de las manos memoriosas,
de esta indecisión
con la que llega la mañana
y entran por las rendijas
los dedos del sol.
Nos decimos lo poco que resta.
Cada día nos entrega su propio peso
y lo agradecemos como un regalo
del «dador de la vida».

Sabía el Tlatoani de Texcoco
que pasamos sólo un momento aquí
y nos vamos
con el primer aire del otoño.
Cada minuto es una vida entera
subiendo hacia las nubes
cayendo en los brazos de la tierra.

quarta-feira, março 07, 2007

terça-feira, março 06, 2007

papai noel

hoje chegou pelo correio, como um presente de papai noel atrasado

Grande sertão: veredas - Guimarães Rosa
Memória e vida - Henri Bergson
mãos de cavalo - Daniel Galera
juventude J.M Coetzee
new and colected poems - czeslaw milozs
conhecimento do inferno - antonio lobo antunes
ela e outras mulheres - rubem fonseca
Relato de um Certo Oriente - Milton Hatoum
Extremely Loud and Incredible Close - Jonathan Safran Foer

uhu!

segunda-feira, março 05, 2007

quem?

"Quem inventou o amor
Teve certamente inclinações musicais"

Geraldo Azevedo - inclinações musicais

sábado, março 03, 2007

exílios

Eu sempre exigi em silêncio. O triunfo de uma vontade caprichosa e cruel. Um exílio voluntário e vil, já que espero sempre aquilo que não posso dar. Levando as "mãos distantes do meu peito", sou incapaz do primeiro gesto, a gênese que parte de mim é mais trevas que luz. Travo com personagens em minha cabeça longas discussões que, de tão longas, ganham um aspecto de verdade, e novamente guardo para mim as palavras que precisam de raiz e terra. Grito que é injustiça se acho que alguém não deu o mesmo valor que dei para algo. Grito que sou diminuído assim, eu que me exponho escondido, que me entrego ao espelho como a uma janela. Mas tudo que grito, grito sozinho.

sexta-feira, março 02, 2007

diferentes trilhas, a mesma dor

A dor, segundo o jazz, é cool e lenta, parece a fumaça que dança ao sair de um cigarro.

A dor, segundo o flamenco, é toda intensidade, é aquela necessidade de correr, as palmas marcam o ritmo dos passos.

A dor, segundo o tango, é elegante, não perde a compostura, não dobra os joelhos.

A dor, segundo o samba, é sincopada, feita para dançar, um sorriso que vai se cansando da boca e some.