terça-feira, setembro 29, 2009

pedido ao tempo

há de ser ouvido por mim
seus compassos escuros, no estalo,
e claros, no silêncio

há de ser absorvido nos poros
as gotas de esquecimento
e estrelas de memória
que correm em suas lacunas

há de ser construído uma enorme
estalactite ou castelo de areia,
iguais na forma
e distintos na pedra,
suas duas faces

há de ser exato nas mãos
e transbordante nos olhos,
provendo outra pele
a cada piscar de pálpebra
(acendendo e apagando o mundo,
testando sua continuidade)


há, por fim, de emprestar
sua constância aos meus gestos,
aos meus gritos,
e sua fluência à verborragia
de meu silêncio
(e que se desfaça em seu fio
outro fio, mas fino e frio,
que ligue meus olhos a todos os nomes)

quinta-feira, setembro 24, 2009

Da janela do quarto

Da minha janela vejo,
em primeiro plano, a árvore,
nascida em solo insólito,
e, longe, onde a chuva cessa,
o prédio abandonado.

Mais do que a própria chuva,
inconstante em sua semelhança,
ligam-se os dois elementos enquadrados
na esquadria da janela:

ambos falam de um passado esfumaçado,
sente-se o abandono nas folhas
onde palavra nenhuma foi escrita,
e nos galhos, raízes aéreas, perdidas
no desterro do ar.

Sente-se vida no prédio abandonado,
nas plantas abismando o concreto,
vitória do abstrato, onde não havia
imaginação nem viço,
fantasmas do que ali já se passou.

Hoje a chuva fez muito, ligando para mim
as imagens que nunca vi, como se a janela
da sala fosse na verdade a de um trem,
que passa e esquece...

(a soma de dois elementos, somando
um terceiro, o escondido, o escuro
de dentro, um sumiço, um possível...)

quarta-feira, setembro 23, 2009

Fome

Historinha contada no Mad Men dessa semana:

Algumas cobras podem ficar meses sem comer nada, mas quando conseguem alguma coisa, elas estão com tanta fome que sufocam enquanto estão comendo.

domingo, setembro 20, 2009

Troca

Substituir uma voz,
Raiz dos problemas e da ânsia.
Trocar um abraço por outro,
Novo, outras mãos que procuram
A mesma fome, insubstituível.

Outros olhos olhando o mesmo.
Novos passos conhecendo os pés
Cansados da instabilidade da água,
Buscando terra, querendo novas pistas
De vôo, marcando outras trilhas
Em areias cambiantes.

Outro peito onde pousará a cabeça
Cansada dos sonhos escuros,
(será que ainda sonha comigo?
- o rosto do passado no sem tempo
Do sono – eu a invadir camas estranhas)

E agora ao cruzar as ruas
De um novo labirinto,
Perdida ou encontrada na velha cidade
Que despertou de novo,
Nomeando cada árvore para outro ouvido,
Rindo dos cachorros trôpegos,
Esquivando-se dos carros bêbados,
Sorrirá por um amor escolhido
Entre milhões, entrevado até os postes
Iluminarem estas novas decisões.

(Quantos relógios são necessários
Para se apagar um rosto?
Quantos sóis boiando no céu
Para se escurecer uma voz?
Quantas estradas para enterrar
Os pés cansados, as mãos hesitantes?)

Tudo de novo, a mesma história,
Mesmo medo, desejos e discórdias,
Diásporas e depois o começo, igual,
Agora com novo nome.

terça-feira, setembro 15, 2009

na amurada

saber-se apenas
uma fresta, luz recortada

“o silêncio das janelas”
e o verbo na amurada

as ondas a explodir
no convés, nonada

tempestades ínfimas
em paredes opacas

sem fotos, sem quadros
nem passos, jangadas

náufragas no interior
de uma cama larga

vazia se não fosse um
no início de uma saga

sexta-feira, setembro 11, 2009

outro auto-retrato

pirotecnias do silêncio
em combustão de lago
ou melhor
"educado pela pedra"

terça-feira, setembro 08, 2009

pequeno auto-retrato

o que meus traços não mostram
é que os limites que me moldam
nada mais são que moinhos de vento
combatendo cavaleiros reais

quarta-feira, setembro 02, 2009

Refuge of the road - Joni Mitchell



I met a friend of spirit/ He drank and womanized/ And I sat before his sanity
I was holding back from crying/ He saw my complications/ And he mirrored me back simplified/ And we laughed how our perfection/ Would always be denied/ "Heart and humor and humility"/ He said "Will lighten up your heavy load"/ I left him for the refuge of the roads/ I fell in with some drifters/ Cast upon a beachtown
Winn Dixie cold cuts and/ highway hand me downs/ And I wound up fixing dinner/ For them and Boston Jim/ I well up with affection/ Thinking back down the roads to then
The nets were overflowing/ In the Gulf of Mexico/ They were overflowing in the
refuge of the roads/ There was spring along the ditches/ There were good times in the cities/ Oh, radiant happiness/ It was all so light and easy/ Till I started analyzing/ And I brought on my old ways/ A thunderhead of judgment was/ Gathering in my gaze/ And it made most people nervous/ They just didn't want to know/ What I was seeing in the refuge of the roads/ I pulled off into a forest/ Crickets clicking in the ferns/ Like a wheel of fortune/ I heard my fate turn, turn turn/ And I went running down a white sand road/ I was running like a white-assed deer/ Running to lose the blues/ To the innocence in here/ These are the clouds of Michelangelo/ Muscular with gods and sungold/ Shine on your witness in the/ refuge of the roads/ In a highway service station/ Over the month of June/ Was a photograph of the earth/ Taken coming back from the moon/ And you couldn't see a city/ On that marbled/ bowling ball/ Or a forest or a highway/ Or me here least of all/ You couldn't see these cold water restrooms/ Or this baggage overload/ Westbound and rolling taking/ refuge in the roads